A bolha Tech

Augusto Vilarim
8 min readMar 6, 2023

E por que essa crise é uma crise de margem de investimento e não uma re-adequação do mercado.

Eu, particularmente, não me acho um narrador confiável para falar sobre isso, aqui, mas explico isso no final do texto.

Porem, eu comecei a me interessar a escrever sobre o mercado de Tecnologia e o modelo empresarial, em geral, por conta desse movimento de transição de carreira que bombou com a Pandemia.

Sério, em 2021, todas as pessoas que puderam, tentaram ir para a área de TI.

E gente, antes que venham me chamar de antiquado ou conservador, por favor, parem!!! Que bom que estamos diversificando um ambiente dominado por homem branco hétero cis (eu, “incluso”)

Esse movimento veio muito forte e foi aquecido pelas empresas querendo cada vez mais gente pra suprir uma demanda que tava pegando fogo.

Guarda essa informação, porque eu vou voltar aqui pra levantar questões.

Se 2021 foi o ano do aquecimento, agora, parece que “famigerada” bolha estourou.

Existe no mundo hoje, um movimento de demissões em massa iniciado pelas big techs, como Amazon, Meta, Google, etc e isso causa uma instabilidade gigante no mercado.

Pro profissional, esqueça a estabilidade. Se a Google demite alguns mil funcionários, imagine uma pequena startup. Esse movimento é induzido pelas grandes companhias e pelos investidores que aproveitaram o movimento intensificado pela pandemia de crescimento das TIs para investir.

E quando o “mercado” investe, ele quer retorno. Na Pandemia e nesse boom de migração de carreira, o retorno parece que retornou proporcional ao que desejavam.

E eu falo induzido, não necessariamente provocado intencionalmente, porem… eu acho que foi provocado.

Aqui, eu quero falar do meu gatilho:

A umas semanas atrás, o pessoal do Love The problem, um podcast dos mais respeitados na comunidade de Agilidade, fez um episódio, esse que tá o link aí em cima, para falar sobre essa Crise.

Eu “gostei” do episódio. Levanta vários pontos interessantes, como nos primeiros 15 minutos onde eles falam sobre uma “tempestade perfeita”, uma crise que é “a cara da bosta”, e um problema na dinâmica do mercado e de como ele opera.

Aí vem o ponto… é a cara da bosta, a tempestade perfeita, mudança de dinamica pra quem?

Gente, aqui eu não estou querendo desmerecer o ponto de vista do pessoal do podcast. Acho que estamos querendo trilhar o caminho certo, mas precisamos pontuar quem são as referências que norteiam esse caminho.

Mas eu comecei a ficar incomodado como, SEMPRE, eles só colocam a visão do empreendedor/investidor que precisa ter a “difícil missão” de demitir uma pá de gente. Veja, não to julgando, é fato que, decidir sobre a vida de algumas centenas (ou milhares) de pessoas é uma decisão, no mínino, difícil.

Com argumentos plausíveis, eles puxam você pra olhar com um viés dos investidores (O MERCADO), uma empatia pra entender que eles apenas estão protegendo seu investimento.

Independente disso custar a demissão de “alguns” trabalhadores.

Gente, como trabalhador de TI que já tá no mercado a 20 anos, eu não comprei essa empatia.

Em dados atuais, e quero pegar a Meta como exemplo, tivemos quase 13% de demissões da empresa. Ela, porem, cresceu desde a pandemia 94%.

Ta, Augusto, mas e aí? O que isso significa? As empresas podem ter contratado errado?

Podem, mas não acho que isso é justificativa pra um “ajuste” desses.

Eu prefiro sempre pesar em: uma tempestade perfeita para uma crise em TI, mas por que essa crise chega agora… ou melhor, pra quem essa crise chega?

Novamente, o pessoal vem puxando a linha da empatia com o empresário que ta sofrendo. Existe uma mudança de paradigma nas Venture capital e dos investidores em geral.

Chegou a conta da austeridade. O mercado, que antes tava aquecido e prometendo retornos maravilhosos, agora, parece ta olhando aonde enxugar e diminuir o custo. O primeiro lugar, é o trabalhador, né. Sabemos disso historicamente falando.

Mas antes disso, eu pergunto:

Será que as empresas então olhando pra um modelo onde “as contas precisam fechar” mesmo?

Sera que esse argumento é valido? Existe uma preocupação direta mesmo?

Vamos analisar a meta… que teve uma queda de 72% desde seu início. Falando assim parece muito né? E é! Inclusive, uma queda grande de “valor de mercado”, que caiu de 1 Trilhão pra 280 bilhoes de dolares.

Mas, ainda estamos falando de 280 BILHOES de dolares.

Fazendo conta de padaria, pegando o valor médio anual de um Dev nos EUA que deve girar em torno de U$ 150 Mil, com os 12mil demitidos da Meta, dá uma economia de: 2 Bilhoes ano!

Então vamos juntar a essa informação, que a Meta, nesse mesmo artigo da Voce S/A, lucrou, 4.4 Bilhoes num trimestre de 2022, e que foi 50% menor que o mesmo trimestre em 2021.

É isso mesmo pessoal, com 1 mes e meio de lucro, num dos piores trimestres, a Meta manteria seus funcionários por mais um ano.

A partir daqui, eu vou deixar de analisar o que o pessoal do podcast falou, para não parecer que eu quero criar polemica em cima deles, não é esse o ponto.

O ponto vais ser sempre na ideia que ta por trás desse discurso.

Se fala sobre um denominador comum entre as empresas e se induz uma conclusão que tem que se equilibrar eficacia e eficiência. As pessoas e a empresa precisam melhorar a entrega, e então, novamente puxando pra empatia, se monta um cenário onde a solução para melhorar e chegar nesse equilíbrio entre eficácia e eficiência.

Vamos demitir os piores e contratar melhor é uma dessas estratégias. Melhorar a entrega.

Nota que o trabalhador só entra no centro da discussão para ser culpabilizado? Normalmente foi ele que não performou e não conseguiu bater os objetivos que a empresa desenhou.

Ora, o Metaverso não vingou, então, demite a galera pra equilibrar as contas.

Pra mim, mais uma vez, se faz um malabarismo para não mostrar que o equilíbrio que eles tão procurando não é entre eficiência e eficacia, é, sim, mas entre investimento e retorno que o mercado espera.

E aqui que eu volto pra ponto que pedi pra você guardar, ali em cima. O “mercado” antes, especulava com o crescimento exuberante da área de TI, que prometia grandes lucros. Essa especulação injeta dinheiro, faz o mercado crescer, precisar de mais gente, chamar mais pessoas, promover o acesso delas a área.

É totalmente fabricado pelo poder do capital que ta querendo lucrar muito. Quando esse lucro não vem na proporção que o mercado deseja, eles provocam outro movimento que é o inverso. Promovem uma “crise” com demissões.

A gente já construiu todo o cenário, agora é ligar os pontos.

Crise (pandemia) faz o mercado aquecer, com promessa de retorno de investimento alto, pra isso, precisa de gente qualificada. Aumenta a quantidade de vagas disponíveis e isso faz com que os salários e com o poder de barganha do trabalhador aumente.

Tem vaga sobrando em TI! Precisamos de gente!

Isso também alimenta um mercado de cursos rápidos de TI pra entrada de gente quanto antes no mercado. E agora com Low/No code e ChatGPT, isso vem a galope!

Mas as empresas não podem ficar “refens” dos seus funcionários, eles precisam “regular a autorregulação do mercado”. Aí, vem o pulo do gato das demissões. Encher o ecossistema de profissionais qualificados, porem, desempregados, faz aumentar o poder de barganha para o mercado.

Afinal, se vc não quer, tem quem queira! Inclusive, pq quem quer, quer com menos direitos.

Augusto, toda empresa é maligna nesse ponto? Gente, antes de mais nada, isso aqui não é um julgamento moral sobre a ética das empresas. É basicamente uma análise materialista / histórica.

As empresas estão servindo a um proposito específico, e vai tentar atingir ele a todo custo. Lembra que falei de eficiência e eficacia, é isso mesmo que eles tão buscando. Eles tão servindo ao proposito do capital, que é lucrar mais.

Engraçado que, no momento que tava revendo esse texto, saiu o podcast do Porto Digital, falando dessas demissões.

Assim como no do Love The Problem, o pessoal aqui esquece uma parte importante e fundamental da discussão. Colocar o trabalhador no centro dela.

Quando fazemos isso, deslocamos a conversa de quem realmente ta sofrendo, e colocando ele no foco apenas pra culpabilizar a falta de “entrega”.

No final, se individualiza até os pontos de reação, normalmente com ideias passivas, de se preparar, quando a hora chegar, pq agora não é uma questão de SE a hora chegar.

Não temos senso de coletividade para nossos profissionais, a não ser, ter empatia porque esse é um momento difícil da pessoa e tentar ajudar ela a se recolocar. Bonito, mas não resolve o problema.

E agora, voltando pra o início do post onde falei que era um narrador não confiável pra esse tema, é justamente por que eu queria que todos que chegassem aqui, depois dessa construção que promete falar sobre uma bolha tech, ficassem com o mesmo questionamento que eu:

“A quem serve essa crise e por que acontece?”

Quando as empresas decidem, por si só, demitir uma boa quantidade de pessoas, temos um claro embate de interesses entre os investidores e os trabalhadores.

O grande problema disso é que a força que o capital dos investidores tem é inversamente proporcional a união que temos como trabalhadores da área. Se não temos união a gente não tem força nenhuma.

Eles culpabilizam uma crise e “estralam o chicote” demitindo gente. E a gente não pode fazer nada… né?

Nossa luta é mais desproporcional, especialmente se ela for individualizada. Mas o conforto de salários altos, aliados ao medo de uma situação instável, fazem com que a gente se mantenha num estado de inércia.

Eu acredito que, a única forma da gente conseguir se por no centro da discussão é a nossa união como trabalhadores de TI, e tentar levar essa conversa com força do coletivo.

É Fácil? De jeito nenhum! Mas a gente tem que pelo menos começar a falar sobre isso.

O Mercado de TI não vai diminuir, não vai estourar a bolha. Ele apenas vai se adequar as necessidades dos empresarios e investidores.

E a gente, trabalhadores da TI, precisamos colocar nossos pontos pra serem considerados e se adequem tb as nossas necessidades dentro do mercado.

P.S — como já falei aqui, meu objetivo não é e nunca será demonizar as empresas ou seus investidores, é apenas relatar que estamos numa luta desigual e só conseguiremos paridade de força com nossa união.

P.S 2 — Sindicalismo serve pra umas coisas ein!

E ai, que me dizem a respeito?

Se tu gostou, da 10 palmas ai pra mim!
Se gostou demais, dá 50!

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Augusto Vilarim

Aqui eu me pergunto como a gente cria equipes de alta performance para desenvolvimento de software! Agilista e SM na Avanade